O ritmo da vida na sociedade contemporânea é cada vez mais acelerado. A preocupação em diminuir o tempo dos processos com uma gama de novos serviços e novas demandas é quase febril. Podemos citar alguns para ilustrar: para as encomendas, Sedex; para as compras, supermercados 24 horas e serviços de delivery; para o dinheiro, caixas eletrônicos; para as conversas, chamadas de vídeo; para informações, Google; para orientação espacial, GPS; para a refeição rápida, self-service… A tecnologia entrou em cada setor da vida. Ter um smartphone nas mãos pode dar a falsa sensação de tudo poder controlar por meio dos mais diferentes aplicativos, que teriam como objetivos fazer mais e melhor, utilizando menos tempo e menos esforços.
Há um dado curioso que deve nos provocar a reflexão. Esses serviços todos – acima citados – se associam ao poder de consumo das pessoas. Tudo que é mais veloz acaba por ser também mais caro. Logo, quem pode pagar tem um ritmo de vida diferenciado, pois suas demandas poderão ser atendidas mais rapidamente. Os que têm recursos desfrutam cada dia mais das facilidades que o mercado oferece. Devoram o tempo com suas inúmeras atividades, sejam do trabalho, sejam de lazer. Ou são devorados pelo mercado que impõe as necessidades com novas ofertas? De onde veio a expressão “meu sonho de consumo”? Aqueles que têm poucos recursos veem seu tempo tragado pelas muitas horas gastas no transporte para o trabalho e em sua própria atividade. Seu tempo de descanso é diminuído por causa das distâncias a percorrer para ir e voltar ao trabalho. A desigualdade social, quase uma patente de nosso país, se manifesta em todos os âmbitos da vida. Pode-se dizer que os pobres correm contra o tempo para sobreviverem sempre com o mínimo. Por sua vez, as classes mais abastadas correm para viver desfrutando o máximo, sempre com a preocupação de manter o padrão de vida que alcançaram.
No entanto, a vida não foi feita para esse ritmo. Os inúmeros sinais e indicações de estresse denunciam que o ser humano que pode muito, não pode tudo. Urge dar-se conta dos limites e da necessidade de desacelerar. Até a natureza tem reagido à queda do nível de poluentes jogados no ar. O céu parece estar mais azul e as águas costeiras mais claras, como tem mostrado algumas reportagens. A quarentena e o isolamento impostos pelo quadro da pandemia do novo coronavírus evidenciaram que é preciso encontrar um outro modo de vida que permita às pessoas menos desgastes, mais equilíbrio e saúde física, emocional e espiritual, inclusive.
Existe um movimento que propõe uma desaceleração da vida cotidiana, conhecido como “slow movement”. Ele não teria surgido se não vivêssemos numa cultura da pressa. Esse movimento aponta para uma saudável alternativa. Talvez seja a hora de redescobrir que é mais prazeroso e vital apreciar todos os processos da vida. Como os pais que diminuem o ritmo dos passos para serem acompanhados pelos seus filhos pequenos e não os deixar para trás, podemos desacelerar, tanto para curtir mais a vida quanto para não deixar ninguém para trás. E esse pode ser um dos aprendizados da quarentena.
Fonte: João Justino de Medeiros Silva/Arcebispo Metropolitano de Montes Claros