Foi preciso um vírus para que o mundo parasse um pouco para pensar. Microscópico e letal, o corona fez com que a engrenagem de um sistema pautado somente pelas relações economicistas fosse obrigado a frear sua ânsia pelo lucro e voltasse os olhos para coisas que estavam deveras esquecidas. A quaresma cristã viu-se envolvida pela quarentena sanitária, e nunca um período de reclusão e silêncio foi tão disseminado pelas casas e pelas ruas. Pegos de surpresa por tão trágica situação, nós, cristãos, também fomos surpreendidos pela impossibilidade de celebrar, comunitária e devotamente, os mistérios da paixão, morte e ressurreição de Jesus Cristo. A semana mais santa de todas será, este ano, vivida em silêncio e contemplação nos corações dos que amam Jesus Redentor.
Santa e silenciosa. Sete dias de um zelo espiritual que nos entristece, afinal amamos celebrar nossa fé de modo comunitário, mas que também nos engrandece, pois assim reclusos, teremos uma oportunidade ímpar de mirar a cruz de Cristo com olhos sensibilizados pela dor da incerteza e medo que pesa sobre a humanidade – afinal o que será de todos nós diante dessa pandemia que ameaça o ser humano, independente de cor, raça, classe social e religião? Nunca antes disso fomos tão unidos por uma tragédia, e se desejarmos, essa fase de quarentena nos fará sair mais fortalecidos espiritualmente. Mas para isso, repito, teremos que olhar para a cruz de Cristo e nela depositar nossa confiança, em meio há tanto medo, incertezas e ansiedades.
A Semana Santa que nos é dada viver já é excepcional. Sentimo-nos mesmo como o Cristo na cruz, e muitos, como ele, devem estar pensando porque Deus nos abandonou! O grito de Jesus torna-se o grito de tantos de nós – “Meu Deus porque nos abandonastes”. Será mesmo que nesse cenário de guerra contra um vírus estamos a mercê de nossas emoções, lançados numa tempestade sem fim, onde Deus parece ter virado às costas para o mundo?
Não! Pensar assim é desconhecer o amor que Deus tem por nós. Na angústia clamei ao Senhor e ele me ouvir, canta o salmista! Em outros versos, ele afirma que Deus é meu refúgio e proteção. Somente se desespera aquele que estanca a vida aos pés da cruz, e não consegue vislumbrar o que vem depois – a superação da morte, o túmulo vazio, a Ressurreição. Santa e silenciosa será nossa contemplação da cruz, e silenciosa será nossa alegria em antever a Ressurreição certa que se aproxima. Confiemos no Senhor, e permitamos que Ele nos ensine a ser melhores, vivendo com sobriedade e confiança os tempos difíceis que nos cercam. No final de tudo isso cantaremos “Aleluia, o Senhor nos resgatou”. Enquanto isso, aos pés da cruz, fiquemos em silêncio, mas jamais desesperados!
Fonte: Padre Evaldo César , CSSR