Cel. Fabriciano, 26 de abril de 2024

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17 maio
Imagem: Internet

Homilia para Solenidade da Ascensão do Senhor – 16/05/2021

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55º dia das Comunicações Sociais “Vem e verá” (Jo 1,46) 

A Igreja celebra hoje a ligação definitiva entre Céu e terra. Jesus Cristo, que pela encarnação veio morar entre nós, cumpre integralmente sua missão e é resgatado por Deus, sendo acolhido “a direita do Pai”, e levando-nos com Ele para a experiência da eternidade. A Ascensão do Senhor é a definitiva marca da divindade de Cristo, que volta de onde veio para que não ficássemos mais órfãos.

Mas do que a “subida de Jesus”, realidade misteriosa, descrita com linguagem humana nas escrituras, salta-nos aos olhos a reação dos discípulos, que voltam seu olhar para o Céu e ali permanecem em contemplação passiva e admirada. Mas é então que entendemos o sentido maior da Ascensão de Jesus: Ele vai para continuar conosco, pelo ação do Espírito Santo que impulsiona a missão da Igreja. “Porque estão olhando para cima?”. A palavra do Anjo obriga os discípulos a baixarem os olhos e de novo vislumbrarem a realidade da história, que agora depende da presença memorial de Jesus Cristo, e da ação do Espírito Santo e da disposição dos seguidores de Jesus para ser redimida.

Esse olhar para a realidade, e a continuidade da missão, passam hoje pelos relacionamentos humanos, pessoais e mediados. No dia da Ascensão, há 55 anos, a Igreja e seus papas, aproveitam para celebrar e promover a reflexão sobre as Comunicações Sociais e sua presença no mundo como força evangelizadora. Este ano não é diferente, e o Papa Francisco nos convida a pensar a comunicação a partir da experiência vivida, e não somente a partir de mediações tecnológicas.

O papa parte da frase de Jesus no Evangelho de João, retirada da cena onde o apóstolo Filipe encontra-se com Natanael e o convida a seguir Jesus – “Vem e verá”. Partindo dessa premissa, que nos impele a sair de nosso mundo para ver a realidade que nos cerca, o Papa reflete sobre uma comunicação autêntica a partir da “saída” ao encontro da informação, superando a perversa lógica de produzir fatos e verdades estando somente diante de um computador ou um smartphone.

Nos diz o Papa que “é necessário sair da presunção cômoda do «já sabido» e mover-se, ir ver, estar com as pessoas, ouvi-las, recolher as sugestões da realidade, que nunca deixará de nos surpreender em algum dos seus aspectos” (Mensagem para o 55º dia das Comunicações Sociais – DCS). Sem contato com a realidade, corre-se o risco de informar inverdades ou fatos pela metade. Os profissionais da comunicação, sobretudo os que estão de alguma forma ligadas ao espírito cristão, deveriam sempre ter em mente a construção de fatos baseados em “verdades transparentes e honestas”. Para isso é absolutamente necessário “gastar as solas dos sapatos”.

Uma verdadeira e sadia comunicação, que irá produzir frutos de verdade e de adesão, pode ser construída inspirada na transmissão da fé cristã. Ora, “a fé cristã começa assim; e comunica-se assim: com um conhecimento direto, nascido da experiência, e não por ouvir dizer. «Já não é pelas tuas palavras que acreditamos; nós próprios ouvimos…»: dizem as pessoas à Samaritana, depois de Jesus Se ter demorado na sua aldeia (cf. Jo 4, 39-42)”. No cristianismo a verdade é passada pela experiência, pelo testemunho de que vive o amor a Cristo Jesus, muito mais do que pela beleza das palavras. “O método «vem e verás» é o mais simples para se conhecer uma realidade; é a verificação mais honesta de qualquer anúncio, porque, para conhecer, é preciso encontrar, permitir à pessoa que tenho à minha frente que me fale, deixar que o seu testemunho chegue até mim”, afirma Francisco.

Nesse sentido, o papa agradece a ousadia e a coragem dos profissionais da comunicação que se empenham em buscar nas fontes a razão de suas informações, expondo-se muitas vezes a risco de morte e outras espécies de perseguições políticas e culturais. Essa coragem mostra-nos situações e fatos de lugares e pessoas que jamais nos seriam oferecidas, e por isso “seria uma perda não só para a informação, mas também para toda a sociedade e para a democracia, se faltassem estas vozes: um empobrecimento para a nossa humanidade”. Não fora a coragem e a ousadia dos comunicadores sociais, que nos levaria a visitar as realidades de pobreza, guerras, desigualdades, perseguições civis e militares que abundam pelo mundo afora? Quem denunciaria os crimes humanitários se não fossem os ousados profissionais da comunicação?

Mas Francisco sabe bem que estamos também envoltos em uma atmosfera pesada de desinformação. A expansão das redes sociais, e a popularização da internet, faz com que a informação esteja cada vez mais ao alcance de todos, com rapidez incrível, mas com muitos ruídos e sombras. O mal uso das redes sociais, sobretudo pelas chamadas “fake news” e pelo crescimento dos “haters”, empobrece e polui as relações humanas mediadas pelas tecnologias. Esses ruídos atingem toda a sociedade e nesse sentido a Igreja não fica de fora, já que faz parte do corpo social humano. Antes somente preocupada em ter que administrar os ataques e críticas que vinham “de fora”, hoje a Igreja sofre com um maciço ataque que nasce na própria instituição, fruto de um conservadorismo ríspido, anacrônico e desenraizado que surge em diversos grupos católicos.

Essa espécie de milícia digital católica utiliza-se de linguagem violenta e agressiva para tentar implantar uma visão eclesial pré-conciliar, enviesada de preconceitos e amparada por trechos e frases da autoridade magisterial. Sua tese é a busca de uma catolicismo puro, cristalino e perfeito, encontrado utopicamente na igreja pré-moderna. Tudo e todos os católicos que sadiamente não comungam desse modelo de igreja são postos nas hostes da heresia, como fazem alguns grupos com a própria autoridade eclesial do Papa Francisco, de instituições da Igreja, com a CNBB e com alguns padres em particular.

Altamente consolidados e detentores da linguagem das redes, esses grupos deturpam a catolicismo, e se tornam cristãos dados à violência verbal. “Pretendendo defender os outros mandamentos, se ignora completamente o oitavo: não levantar falso testemunho” e destrói sem piedade a imagem alheia” (GE,115). Esses grupos antievangélicos e antievangelização têm sido um grande propagador da divisão da Igreja, e incorrem no erro de desejarem ser a igreja perfeita, que no fundo, está muito distante de Jesus Cristo e de seu projeto de Reino de Deus.

Vivem a margem do tempo, pois só admitem o catolicismo pré-Vaticano II; vivem à margem dos lugares, pois detestam e criticam toda espécie de enculturação, julgando ser a igreja centro-europeia a única cuja tradição é católica; vivem à margem dos irmãos na fé, pois para eles o papa, muitos bispos, padres e leigos são heréticos. Para esses supostos iluminados, a única igreja que deveria existir era a deles. Quando insistem nesse forma de agressão e ataques, passam a formar uma igreja paralela, e se auto excluem da comunhão eclesial. Perderam o senso da “unidade na diversidade”.

Seguindo confiante na missão a ele dada, Francisco lamenta essa agressividade das redes, e afirma que a superação dessa polarização nasce de uma comunicação encarnada, que verifica os fatos e tem coragem de olhar nos olhos. “Na verdade, nos dia Francisco, não se comunica só com as palavras, mas também com os olhos, o tom da voz, os gestos. O intenso fascínio de Jesus sobre quem O encontrava dependia da verdade da sua pregação, mas a eficácia daquilo que dizia era inseparável do seu olhar, das suas atitudes e até dos seus silêncios”.

Essa metodologia de Jesus, de convidar para estar com ele, ver a realidade, era a maneira de apresentar a verdade da fé. “A boa nova do Evangelho difundiu-se pelo mundo, graças a encontros pessoa a pessoa, coração a coração: homens e mulheres que aceitaram o mesmo convite – «vem e verás –, conquistados por um «extra» de humanidade que transparecia brilhou no olhar, na palavra e nos gestos de pessoas que testemunhavam Jesus Cristo”. Por isso, o desafio que nos espera é o de comunicar, encontrando as pessoas onde estão e como são.

Na solenidade da Ascensão de Jesus, miremos o Senhor que está nos Céus, mas sigamos com os olhos fixos na história. Há muito o que transformar, e nesse sentido, o modo como comunicamos o amor, e fugimos da propagação de mentiras, calúnias, e fofocas, é termômetro claro se estamos ou não sendo verdadeiros profetas da Boa Nova de Jesus Cristo!

Terminamos rezando com as palavras do Papa Francisco, para este 55º dia das comunicações sociais:

Senhor, ensinai-nos a sair de nós mesmos,
e partir à procura da verdade.
Ensinai-nos a ir e ver,
ensinai-nos a ouvir,
a não cultivar preconceitos,
a não tirar conclusões precipitadas.
Ensinai-nos a ir aonde não vai ninguém,
a reservar tempo para compreender,
a prestar atenção ao essencial,
a não nos distrairmos com o supérfluo,
a distinguir entre a aparência enganadora e a verdade.
Concedei-nos a graça de reconhecer as vossas moradas no mundo
e a honestidade de contar o que vimos. Amém!
Louvado seja nosso Senhor Jesus Cristo!

Fonte: Pe. Evaldo César de Souza, C.Ss.R