Sete Semana com Jesus/ 2021
Pecados Capitais/ Virtudes capitais
Semana 02 – Avareza X Generosidade
Seguindo nosso itinerário pelos pecados capitais, essa semana vamos refletir sobre a avareza.
1. Etimologia
Do latim AVARUS, relacionada ao verbo AVARE, “querer muito, desejar desesperadamente”. A palavra avareza, segundo a significação originária, está ligada a uma desordenada ambição de dinheiro: como diz santo Isidoro, o avarento é ávido de dinheiro. Agostinho afirme haver uma avareza “geral”, pela qual se deseja mais do que o devido alguma coisa, e uma avareza “específica”, à qual se chama usualmente amor ao dinheiro.
2. Citações
A avareza é um tirano bem cruel; manda ajuntar e proíbe o uso daquilo que se junta; visita o desejo e interdiz o gozo (Plutarco).
O absurdo da avareza está no fato de o avaro viver como pobre e morrer rico (Vittorio Buttafava).
É por causa da avareza ou estupidez do homem que temos pobreza e trabalho excessivo (C. S. Lewis).
Quem é movido pela avareza não tem olhos nem coração para sentir o sofrimento dos outros, porque estes lhe são apenas um valor econômico. A avareza tira a capacidade de compaixão. E, com isso, tira a nossa condição de seres humanos (Rubem Alves).
“O homem não se torna bom por possuir coisas boas. Ao contrário, o homem torna boas as coisa que possui, ao usá-las bem” (Santo Agostinho).
3. Definição
Dentre os chamados pecados capitais, está a avareza. A avareza é condenada nas Escrituras como uma forma cruel de idolatria, pois coloca o dinheiro no lugar de Deus (Salmo 49). O problema não está em possuir dinheiro, pois ele é necessário para as necessidades do ser humano; o pecado está em fazer do dinheiro seu próprio deus. Em outras palavras, podemos dizer que o mal não é o dinheiro em si, mas o amor a ele. O mal consiste em buscar o dinheiro como um fim, não como meio. As escrituras não condenam as posses materiais e o bom uso dos bens, mas condena a riqueza conseguida por meio de desonestidades e roubos, a confiança no dinheiro como solução para todos os problemas, a corrupção em vista do lucro e a incapacidade de partilhar o que se tem.
Ah, o dinheiro! Muitos acham que nele está a solução de todos os problemas. Aqui está o risco que coloca o poder do dinheiro como algo absoluto. Se o dinheiro pode tudo, então ele se torna absoluto e ocupa lugar de Deus. É exatamente por isso que Jesus foi incisivo na constatação: não se pode servir a dois senhores, a Deus e ao dinheiro, porque é impossível a coabitação (e mesmo a existência!) de dois absolutos.
O avarento ouve a sedução das riquezas, que prometem a suficiência dos bens temporais, daí que a avareza, o desordenado afã de riquezas, seja considerada vício capital, pois os bens temporais jamais nos serão garantia de felicidade e plenitude humana.
Os verbos preferidos dos avarentos são: ter, possuir, acumular, ganhar, multiplicar. Os verbos contrários – doar, partilhar, distribuir, dividir, perder – causam-lhes mal-estar. O avarento prefere os bens materiais ao convívio com Deus. A Avareza faz com que o dinheiro ocupe no coração o lugar que deveria ser somente de Deus.
Porque a avareza é um pecado: porque é uma forma de idolatria, e toda idolatria é pecaminosa, pois coloca o dinheiro no lugar de Deus. São Paulo, na Carta aos Colossenses, chama o pecado da avareza de pecado de idolatria. “Mortificai, pois, os vossos membros terrenos: fornicação, impureza, paixões, desejos maus, cupidez e a avareza, que é idolatria” (Cl 3,5).
O avarento cultua suas riquezas, vive por elas e para aumenta-las, teme ser roubado e acha que todos estão interessados somente em suas posses. São pessoas desconfiadas, tristes e solitárias. A avareza quase sempre está ligada a outros pecados, como roubos, corrupção, dinheiro sujo, opressão dos mais pobres, pagamento de salários injustos, crimes ambientais e até escravidão, pois para o avarento não importam os meios de ganhar o dinheiro, contanto que sua conta bancária cresça e nunca seja tocada.
O retrato do avarento é Harpagão, um velho que educa os filhos para a sua mesquinharia e desconfia da lealdade de todos. Ele não descansa com medo de ser roubado, pois guarda todo seu dinheiro em casa, e vigia para que os filhos não casem com alguém sem dotes.
“Vai esperar por ele na rua, não fiques aqui, em minha casa especado como uma estaca, a observar tudo o que se passa para depois usares em teu benefício. Não quero ter um espião dos meus assuntos permanentemente à minha frente, um tratante, cujos malditos olhos controlam todas as minhas ações, devoram tudo o que tenho, e vasculham em tudo quanto é sítio para verificarem se não há nada que possa ser roubado”. (O avarento de Molière).
São Gregório Magno enumera sete filhas da avareza: a traição, a fraude, a mentira, o perjúrio, a inquietude, a violência e a dureza de coração. Recorde-se Judas que por desejo de prata traiu seu mestre! Quanto mais têm, mais querem. Eis a razão de sua felicidade! A metáfora bíblica da sanguessuga e suas duas filhas – “Me dá” e “Me dá” – retrata-os com perfeição (Provérbios 30,15).
Paradoxalmente, o avarento não é o senhor do dinheiro, mas seu servo. Não é ele quem “diz” ao dinheiro o que deve ser feito, mas ao contrário, o dinheiro governa sua vida, seu comportamento e suas decisões. Mais do que um refém da sua riqueza, é um escravo. Segunda a psicanálise, o avarento está preso na fase mais egoísta de seu desenvolvimento e nunca será um ser humano íntegro e feliz, pois ele não ama pessoas, e sim ama o dinheiro, e este nunca vai poder corresponder ao amor que todos nós precisamos.
Existe uma diferença enorme entre um avarento e uma pessoa econômica: o primeiro acumula porque faz do dinheiro um bem em si, e sofre se pensa em perde-lo. O segundo é equilibrado em suas finanças, e se organiza para viver bem e usufruir dos recursos que consegue ao longa da vida.
4. O Avarento na vida do povo
A linguagem popular tem um número ilimitado de palavras e expressões para definir tal desequilíbrio psíquico, pela intensidade do apego às coisas materiais, especialmente o dinheiro: pão-duro, mão-de-vaca, sovina, unha de fome, mão de finado, mão de vaca, fulano não abre a mão nem para dar tchau.
Um indivíduo avarento é considerado popularmente como pão-duro, essa expressão surgiu por conta da história de um suposto mendigo que viveu no Rio de Janeiro e que, ao pedir doações, dizia que aceitava qualquer coisa, até mesmo um pão duro. Após seu falecimento, descobriram que ele tinha muitos bens e se passava por morador de rua para acumular mais coisas.
Um indivíduo avarento quer ter cada vez mais bens, mas sem nenhum motivo justo, apenas pelo prazer de acumulá-los. Para isso, se aproveita de qualquer oportunidade para não gastar dinheiro. Aqueles que têm essa característica deixam de viver experiências, de ajudar outras pessoas ou mesmo de investir em coisas que estejam precisando, apenas para manterem seu patrimônio intacto.
Uma mistura de ganância e obsessão por acumular, com uma pitada de egoísmo, a avareza é simbolizada por Mamon, demônio chamado de, veja só, o Senhor do Dinheiro. “Não podeis servir a Deus e ao Mamon”(Mt 6,24). Tem um coisa-ruim só para recordar os que são afetados pelo vício de querer ter mais e mais, e nunca repartir!
5. Principais Hábitos de um Avarento
Se você convive com uma pessoa que demonstra sinais de avareza em seu comportamento, confira quais são os principais hábitos que os avarentos costumam ter para se certificar se é esse mesmo o caso.
1. Deixa de fazer coisas que gosta para não gastar dinheiro;
2. Tem um grande medo de perder o que possui;
3. Se recusa a ajudar alguém se isso for lhe custar algo;
4. Evitar fazer uso de objetos para mantê-los intactos;
5. Se aproveita da bondade alheia para economizar;
6. Não valoriza as coisas boas da vida;
7. Nunca está satisfeito com o que tem;
8. É atraído por coisas materiais.
6. Atualização
A avareza – A globalização da avareza é o jogo do mercado, o consumismo mundial com a depredação do meio-ambiente, as manobras dos países ricos e a corrupção. A concentração da renda, a competição, o lucro são formas globalizadas da avareza.
O catecismo não hesita em dizer: “Uma teoria que faz do lucro a regra exclusiva e o fim último da atividade econômica é moralmente inaceitável. O apetite desordenado pelo dinheiro não deixa de produzir seus efeitos perversos. Ele é uma das causas dos numerosos conflitos que perturbam a ordem social”. (Catecismo, n. 2424).
Numa sociedade onde deus é o dinheiro, somos conduzidos pelos sacerdotes do mercado, pelas igrejas-financeiras que governam nosso crédito e nos abrem as portas do paraíso-crédito! Sua liturgia é o trabalho-consumo, o dinheiro é seu caminho de salvação. A felicidade se concretiza na prosperidade material. Atividades econômicas adquirem caráter sagrado. A fé no dinheiro move empresas, juízes e governos. A confiança do capitalismo em seu deus é expressada no dinheiro. Basta ver que no dólar está escrito: “In God we trust”.
Também as religiões disputam consumidores. Na era da avareza, Deus tem preço. Púlpitos são balcão de negócios. Deus pode ser comprado. A mensagem do Evangelho é substituída pela teologia da prosperidade. A avareza expulsa Jesus, descristianiza o cristianismo. A avareza, dogma da religião do capital, é causa primeira da injustiça, da barbárie social, da violência e da corrupção. As agressões mais cruéis contra Deus, contra a vida e a dignidade humana vêm da avareza. Não me importa o outro, somente me importa o dinheiro! Sou educado a querer mais e mais, e acreditar que somente o dinheiro é que vai me trazer felicidade e realização.
Há fortunas que jamais serão gastas numa vida. E onde está o sentido disso? Para que possuir mais, se o que já se tem não será nunca gasto? Pior ainda: essas pessoas e empresas buscam acumular mais, por meio de corrupção, de sonegação de impostos, da exploração dos bens naturais, do trato injusto com a mão de obra.
No coração do capitalismo está o amor ao dinheiro. Este sistema tem finalidade em si mesmo – acumular capital com o único fim de aumentar o próprio capital, que será reinvestido para sempre aumentar ainda mais o capital. Eis a lógica da avareza. Sua alma é o princípio da acumulação material, amar mais as coisas do que as pessoas. Dinheiro acima de tudo e de todos. Nada é mais importante. É o sentido da vida.
O cristianismo associa a avareza à idolatria. “A adoração do antigo bezerro de ouro (Êxodo 32,1-35) encontrou uma versão nova e impiedosa no fetichismo do dinheiro e na
ditadura de uma economia sem rosto e sem um objetivo verdadeiramente humano” (Evangelii gaudium, 55).
A oposição entre o amor ao dinheiro e o amor a Deus atinge dimensões dramáticas na religião do capitalismo, onde o dinheiro ocupa o lugar de Deus. “Onde há idolatria, apagam-se Deus e a dignidade do ser humano” (Evangelii gaudium, 57).
7. Alguns exemplos da condenação da avareza na Bíblia
Como já dissemos, as Escrituras são claras em condenar os que fazem do dinheiro a razão de suas vidas. O desejo incontrolável pela posse dos bens materiais, em detrimento da confiança em Deus, torna-se idolatria, mal que destrói o ser humano, ao colocar outro supremo no lugar de Deus.
1. “Ai daqueles que juntam casa com casa e campo com campo, até que não sobre mais espaço e sejam os únicos a habitarem no meio da terra” (Isaías 5,8).
2. “Ai daqueles que, deitados na cama, ficam planejando a injustiça e tramando o mal! É só o dia amanhecer, já o executam, porque têm o poder nas mãos. Cobiçam campos, e os roubam; querem uma casa, e a tomam. Assim oprimem o varão e sua casa, o homem e sua herança” (Miqueias 2,1-2).
3. O profeta Jeremias foi duro ao denunciar a avareza do rei Joaquim, ao lhe dizer: “Você não tem olhos nem coração, a não ser para a tua avareza, e para derramar sangue inocente, e para praticar a opressão e a violência” (Jeremias 22,17).
4. O profeta Ezequiel não deixa por menos, ao desmascarar a liderança de Jerusalém. “Seus príncipes parecem lobos que estraçalham a presa, fazendo correr sangue e destruindo vidas, movidos pela avareza” (Ezequiel 22,27).
5. “Quem lucra com ganhos desonestes perturba sua própria casa, mas quem odeia ofertas de suborno viverá” (Provérbios 15,27).
6. Jesus narra a parábola de um rico proprietário, cujas terras produziram enorme colheita (Lucas 12,16-21). Num surto de avareza, decidiu demolir seus depósitos e construir outros maiores, para recolher todo o seu trigo e suas riquezas. Entretanto, os planos de Deus eram outros: naquela mesma noite haveria de morrer e seu extraordinário patrimônio seria desfrutado por outros.
7. Jesus também narra a história do jovem rico, que apesar de ser cumpridor da Lei, não foi capaz de deixar para trás uma vida de riquezas (Mc 10,21).
8. “Cuidado! Evitem todo tipo de avareza, porque ainda que alguém seja muito rico, sua vida não é garantida pelos seus bens” (Lucas 12,15).
9. “Não ajunteis tesouros aqui na terra, onde a traça corrói e onde os ladrões roubam. Ajuntai tesouros no céu, pois é no céu que deve estar nosso coração” (Mt 6,19).
10. Jesus, no Sermão da Montanha, alertou os discípulos quanto ao pecado da Avareza. “Ninguém pode servir a dois senhores, porque ou odiará a um e amará o outro, ou se dedicará a um e desprezará o outro. Não podeis servir a Deus e ao dinheiro” (Mt 6,24).
8. Generosidade
Todo pecado combate-se com o fortalecimento de uma virtude. Na contramão da avareza está a generosidade e a justiça. É próprio da justiça, na concepção bíblica, que cada um tenha o que lhe é devido; já a generosidade (liberalidade) estabelece o meio a partir das próprias condições da alma, isto é, de modo que não se tenha exagerado afã ou avidez de dinheiro e saiba gastá-lo com prazer e sem tristeza quando e onde seja necessário, sobretudo na ajuda àqueles que mais necessitam de apoio e amparo.
“Não existe maior amor, do que dar a própria vida em favor dos amigos” (João 15,13).
“O Filho do Homem não tem onde repousar a cabeça” (Mateus 8,20).
A primeiras comunidades dos discípulos de Jesus compreenderam a importância de banir de seu meio a tentação da avareza, como exigência do compromisso com o Reino. Essa leitura mostra o ideal da Igreja de Jesus e do sonho do Reino de Deus. Eis porque “vendiam suas propriedades e bens, e os repartiam entre todos, conforme a necessidade de cada um” (Atos 2,45), pois “tinham tudo em comum” (Atos 2,44). Por “serem um só coração e uma só alma, ninguém dizia que eram seus os bens que possuía, mas tudo entre eles era posto em comum” (Atos 4,32). Resultado: não havia necessitados entre ele, pois os proprietários de terras e casas vendiam-nos e colocavam o dinheiro “aos pés dos apóstolos”, que faziam a distribuição “a cada um segundo a própria necessidade” (Atos 4,35).
O trecho de Hb 13,5 contém uma orientação de grande atualidade: “Que a conduta de vocês não se baseie no amor ao dinheiro. Fiquem satisfeitos com o que vocês têm, pois Deus disse: ‘Nunca vou deixar ou abandonar você’”.
Por isso, para se vencer o pecado da Avareza, a Igreja nos motiva a viver a generosidade, a gratuidade da partilha do que temos e somos. Assim, entenderemos que os bens devem estar a serviço da vida e não a vida acontecer em função de conquistar bens; a maior conquista deve ser a própria vida.
Entre os remédio contra o pecado da avareza a Igreja coloca a esmola, além do jejum e da oração. “Dá esmola de teus bens, e não te desvies de nenhum pobre, pois, assim fazendo, Deus tampouco se desviará de ti” (Tob 6,8); ou ainda, “Encerra a esmola no coração do pobre, e ela rogará por ti a fim de te preservar de todo mal. Para combater
o teu inimigo, ela será uma arma mais poderosa do que o escudo e a lança de um homem valente” (Eclo 29,15-16).
Uma belíssima oração de pós-comunhão nos ajuda a refletir sobre o desapego dos bens materiais, e assim vencer o pecado da avareza. “Aproveite-nos, ó Deus, a participação nos vossos mistérios. Fazei que eles nos ajudem a amar, desde agora, o que é do céu; e caminhando entre as coisas que passam, abraçar as que não passam”. O segredo está exatamente nisto: “caminhando entre as coisas que passam, abraçar as que não passam”. Precisamos nos prender aos bens eternos e não aos bens passageiros deste mundo.
Fonte: Pe. Evaldo César de Souza, CSSR